DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS
A Constituição Federal (CF) de 1988 faz menção aos portadores de deficiência em 7 de seus 250 artigos. São referidos a seguir aqueles que interessam mais de perto ao portador de deficiência visual em seu dia-adia.
No capítulo relativo aos direitos sociais, proíbe-se qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência (art. 7º, XXXI). Isso significa que, quando compatíveis com a atividade laboral, limitações físicas, mentais ou sensoriais de que o trabalhador seja portador não podem ser invocadas como motivo para se lhe recusar emprego ou pagar menos pelo seu trabalho.
Postos de trabalho são assegurados no serviço público. De acordo com o art. 37, VIII, a administração pública deve reservar um percentual dos cargos ou empregos aos portadores de deficiência toda vez que realizar um concurso para admissão de servidores. A obrigatoriedade da reserva de vagas aplica-se aos três Poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário – e às três esferas de governo – federal, estadual e municipal.
A assistência social, segundo dispõe o art. 203, há de ser prestada a quem dela necessitar e tem, entre outros, os seguintes objetivos: a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária (inciso IV), e a garantia de um salário mínimo mensal àquelas que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família (inciso V).
No que diz respeito à educação, direito de todos e dever da família e do Estado, cabe a este proporcionar atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino (art. 208, III). Essa diretriz corresponde ao que a legislação chama de “educaçãoespecial”.
Os deveres constitucionais do Estado para com os portadores de deficiência não se esgotam aí. Compete-lhe também proporcionar assistência integral à saúde da criança e do adolescente e, como parte dela, promover a “criação de programas de prevenção e atendimento especializado para os portadores de eficiência física, sensorial ou mental, bem como de integração social do adolescente portador de deficiência” (art. 30 227, § 1º, II). Como pôr esse ideal em prática? O próprio art. 227, § 1º, responde:com a participação de entidades nãogovernamentais– as chamadas ONGs – e mediante o treinamento para o trabalho e a convivência, e a facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de preconceitos e obstáculos arquitetônicos.
Releva saber que muito do que se referiu acima já se encontra regulamentado em leis e decretos, que por sua vez estão disciplinados em normas de hierarquiainferior que visam dar-lhes concretude. O conjunto dessa legislação é aqui abordado, dando-se destaque ao que é de interesse específico do portador de deficiência visual.
LEI 7.853/89 E DECRETO 3.298/99
A Lei 7.853, de 24/10/1989, é a lei que com maior abrangência dispõe sobre as questões atinentes à pessoa portadora de deficiência. Estabelece normas gerais que asseguram o exercício dos direitos dos portadores de deficiência e sua integração social, institui a tutela jurisdicional de interesses coletivos ou difusos dessas pessoas, disciplina a atuação do Ministério Público, define crimes e dispõe sobre a Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência. É regulamentada pelo Decreto 3.298, de 20/12/1999, mediante o qual foi instituída a atual Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência. São resumidos a seguir alguns dos pontos principais dessas duas normas, que juntas valem por um estatuto da pessoa portadora de deficiência. Garantia de direitos A Lei 7.853/89 garante aos portadores de deficiência a atenção governamental às suas necessidades e define a matéria como obrigação nacional a cargo do poder público e da sociedade (art. 1º, § 2º). Segundo dispõe no art. 2º, caput, cabe ao poder público e seus órgãos assegurar-lhes o pleno exercício de seus direitos básicos, inclusive dos direitos à educação, à saúde, ao trabalho, ao lazer, à previdência social, ao amparo à infância e à maternidade, e de outros que, decorrentes da Constituição e das leis, propiciem seu bem-estar pessoal, social e econômico. Todos esses direitos estão abordados neste Guia.
Tutela jurisdicional e papel do Ministério Público De acordo com a Lei 7.853/89, os seguintes agentes estão legitimados para propor ações civis públicas destinadas à proteção de interesses coletivos ou difusos das pessoas portadoras de deficiência: o Ministério Público, a União, os Estados e o Distrito Federal, os Municípios, e também associação civil (constituída há mais de um ano), autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista que incluaentre suas finalidades a proteção dessas pessoas (art. 3º). O art. 4º estabelece que a sentença, nessas ações, “terá eficácia de coisa julgada oponível erga omnes”, ou seja, valerá para todos na mesma situação. Já o art. 5º obriga o Ministério Público a intervir nas ações públicas, coletivas ou individuais, em que sediscutam interesses relacionados a deficiência das pessoas.
Previsão de crimes e punição A fim de garantir o cumprimento do que estabelece, a Lei 7.853/89 define no art. 8º crimes e punições, conforme indicado aseguir:“Art. 8º Constitui crime punível com reclusão de um a quatro anos, e multa:
I - recusar, suspender, procrastinar, cancelar ou fazer cessar, sem justa causa, a inscrição de aluno em estabelecimento de ensino de qualquer curso ou grau, público ou privado, por motivos derivados da deficiência que porta;
II - obstar, sem justa causa, o acesso de alguém a qualquer cargo público, por motivos derivados de sua deficiência;
III - negar, sem justa causa, a alguém, por motivos derivados de sua deficiência, emprego ou trabalho;
IV - recusar, retardar ou dificultar internação ou deixar de prestar assistência médicohospitalar e ambulatorial, quando possível, a pessoa portadora de deficiência;
V - deixar de cumprir, retardar ou frustrar, sem justo motivo, a execução de ordem judicial expedida na ação civil a que alude esta Lei;
VI - recusar, retardar ou omitir dados técnicos indispensáveis à propositura da ação civil objeto desta Lei, quando requisitados pelo Ministério Público.”
Conade e Corde
Hoje, a coordenação superior dos assuntos, atividades e medidas que se refiram às pessoas portadoras de deficiência está a cargo da Secretaria Especial dosDireitos Humanos da Presidência da República. No desempenho dessa sua missão, a Secretaria conta com dois órgãos principais: o Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência (Conade),órgão colegiado deliberativo, e a Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência (Corde), órgão executivo. Ao Conade compete, entre outras atribuições, zelar pela efetiva implantação da Política Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência; acompanhar o planejamento e avaliar a execução das políticas setoriais de educação, saúde, trabalho, assistência social, transporte, cultura, turismo, desporto, lazer, política urbana e outras relativas à pessoa portadora de deficiência; zelar pela efetivação do sistema escentralizado e participativo de defesa dos seus direitos; aprovar o plano de ação anual da Corde (Decreto 3.298/99, art. 11, I, II, IV e VIII).
À Corde cabe a condução das ações governamentais referentes às pessoas portadoras de deficiência (art. 10 da Lei 7.853/89, com redação dada pela Lei 8.028, de 12/4/1990), devendo, na elaboração dos planos e programas a seu cargo, recolher, sempre que possível, a opinião das pessoas e entidades interessadas e considerar a necessidade de efetivo apoio às entidades privadas voltadas à integração social da pessoa portadora de deficiência (Lei7.853/89, art. 14, parágrafo único).
Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de DeficiênciaA Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, instituída pelo Decreto 3.298/99, tem como princípios a parceria do Estado e da sociedade civil no esforço de assegurar a plena integração das pessoas portadoras de deficiência no contexto socioeconômico e cultural; o estabelecimento de mecanismos e instrumentos legais e operacionais que assegurem a elas o pleno exercício de seus direitos básicos; e o respeito a pessoas que devem receber igualdade de oportunidades na sociedade por reconhecimento dos direitos que lhes são assegurados, sem privilégios ou paternalismos (art. 5º).
Seus objetivos são, dentre outros, o acesso, o ingresso e a permanência da pessoa portadora de deficiência em todos os serviços oferecidos à comunidade, e a integração das ações dos órgãos e das entidades públicos e privados nas áreas de saúde, educação, trabalho, transporte, assistência social, edificação pública, previdência social, habitação, cultura, desporto e lazer, visando à prevenção das deficiências, à eliminação de suas múltiplas causas e à inclusão social (art. 7º, I e II).
Para a consecução dos objetivos que estabelece, o Decreto 3.298/99 preconiza instrumentos como: a articulação entre entidades governamentais e não-governamentais em nível federal, estadual, do Distrito Federal e municipal; a aplicação da legislação específica que disciplina a reserva de mercado de trabalho,em favor da pessoa portadora de deficiência, nos órgãos e nas entidades públicos e privados; a fiscalização do cumprimento da legislação pertinente a ela (art. 8º, I, III e V).
Sistema Nacional de Informações sobre DeficiênciaVisando à organização de um sistema integrado de informações, o Decreto 3.298/99, art. 55, instituiu, sob a responsabilidade da Corde, o Sistema Nacional de Informações sobre Deficiência (Sicorde). O objetivo do Sicorde é desenvolver bases de dados e reunir e disseminar informações sobre políticas e ações na área da deficiência, para uso de organizações governamentais e nãogovernamentais, além dos próprios portadores de deficiência e demais interessados na questão. (Os endereços do Sicorde estão no fim do Guia.)
DIREITOS CIVIS
“Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil”, dispõe o art. 1º da Lei 10.406, de 10/1/2002 (Código Civil).
Essa é a regra geral no que diz respeito às pessoas naturais e é nela que os portadores de deficiência visual se enquadram, desde que maiores de dezoito anos e em pleno gozo da capacidade de discernimento e de expressão de sua vontade.
Em todo o Código Civil, há somente duas disposições que fazem referência direta aos portadores de deficiência visual. A primeira delas, concernente aos meios que servem de prova dos atos e fatos, proíbe-lhes atuar como testemunhas, nos seguintes termos:
“Não podem ser admitidos como testemunhas os cegos e surdos, quando a ciência do fato que se quer provar dependa dos sentidos que lhes faltam” (art. 228, III).
O entendimento legal de que o cego é incapaz para depor como testemunha, quando a prova do fato depender do sentido da visão, também está expresso na Lei 5.869, de 11/1/1973 (Código de Processo Civil), em seu art. 405, § 1º, IV. Essa restrição, no entanto, não é absoluta, pois os próprios Códigos ressalvam que o juiz poderá admitir o depoimento de pessoas cegas quando necessário.
A outra referência explícita que o Código Civil faz ao portador de deficiência visual está no art. 1.867, que assim dispõe: “Ao cego só se permite o testamento público, que lhe será lido, em voz alta, duas vezes, uma pelo tabelião ou por seu substituto legal, e a outra por uma das testemunhas, designada pelo testador, fazendo-se de tudo circunstanciada menção no testamento.” Testamento é o ato formal de disposição da última vontade, mediante o qual a pessoa dá um destino a seu patrimônio para depois de sua morte. Os cuidados extras exigidos no artigo citado – testamento em público, dupla leitura, descrição circunstanciada dos atos praticados – visam garantir a indispensável certeza e segurança ao ato testamentário da pessoa cega. Com relação à curatela, ou curadoria, há no Código Civil um dispositivo alusivo ao portador de deficiência física que decerto há de se aplicar aos portadores de deficiência visual, considerando que esta representa uma limitação física para seu portador. Eis o que dispõe o art. 1.780: “A requerimento do enfermo ou portador de deficiência física [...], dar-se-lhe-á curador para cuidar de todos ou alguns de seus negócios ou bens.”
Busca-se, assim, proteger os interesses de pessoas que, dependendo do grau da enfermidade ou da deficiência física, podem estar em sérias dificuldades para administrar o seu patrimônio.
DIREITO PENAL: PROTEÇÃO
Os pilares do direito penal brasileiro são o Código Penal e o Código de Processo Penal, ambos da década de 40. O Código Penal foi instituído pelo Decreto-Lei 2.848, de 7/12/1940, e o Código de Processo Penal, pelo Decreto-Lei 3.689, de 3/10/1941.
Logicamente, esses Códigos sofreram alterações ao longo dos anos, de modo a refletir as mudanças da sociedade. Visto que “todos são iguais perante a lei”(CF, art. 5º, caput), as pessoas, inclusive as portadoras de deficiência visual, estão igualmente sujeitas às penas previstas, caso adotem conduta, por ação ou omissão, que esteja codificada como infração penal. Somente em três hipóteses o Código Penal isenta o agente infrator de pena: doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado (art. 26), menoridade (art. 27), e embriaguez fortuita completa (art. 28, § 1º). É que, nesses casos, considera-se que o agente não é capaz de compreender a ilicitude de sua conduta, não podendo, assim, ser considerado culpado.
Quem pesquisa os dois Códigos citados não depara com nenhuma referência explícita aos deficientes visuais. O que encontra são duas disposições no CódigoPenal que, embora empreguem a terminologia “deficiência física ou mental”, não deixam de se aplicar a eles. Eis o que estabelece o § 2º dos arts. 203 e 207 (tratase de parágrafos idênticos que foram acrescentados pela Lei 9.777, de 29/12/1998): “A pena é aumentada de um sexto a um terço se a vítima é menor de dezoito anos, idosa, gestante, indígena ou portadora de deficiência física ou mental”. A pena mencionada é de detenção e multa, e os crimes são “frustrar, mediante fraude ou violência, direito assegurado pela legislação trabalhista” (art. 203) e “aliciar trabalhadores, com o fim de levá-los de uma para outra localidade do território nacional” (art. 207). Comete o primeiro crime quem, agindo com violência ou fraude, impede que o ofendido veja satisfeito direito trabalhista, como salário, férias, licenças etc. No caso do segundo, a conduta típica é aliciar, convencer, atrair trabalhadores para que se mudem de localidade. Esses dois crimes, conforme visto, assumem forma qualificada, ou seja, são agravados quando cometidos contra pessoas com menor possibilidade dedefesa, entre as quais os portadores de deficiência visual podem estar incluídos.
Indulto natalino Todos os anos, por ocasião das festividades comemorativas do Natal, o Presidente da República tradicionalmente concede perdão ao condenado em condições de merecê-lo. Os dois últimos decretos editados com essa finalidade favoreceram expressamente os cegos. O mais recentedeles – o Decreto 4.904, de 1/12/2003 – assim dispôs: “É concedido indulto condicional ao condenado à pena privativa de liberdade que seja paraplégico,tetraplégico ou portador de cegueira total, desde que tais condições não sejam anteriores à prática do ato e comprovadas por laudo médico oficial ou, na falta deste, por dois médicos, designados pelo Juízo da Execução” (art. 1º, IV, a).
DIREITOS POLÍTICOS E ELEIÇÕES
Os direitos políticos são exercidos, entre outras maneiras, por meio do voto. De acordo com o art. 14, § 1º, da Constituição Federal, o alistamento eleitoral e o voto são obrigatórios para os maiores de dezoito anos e facultativos para os analfabetos, os maiores de setenta anos, e os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos. Essas condições valem para todos os brasileiros, incluindo os portadores de deficiência visual. As normas que regulam a organização e oexercício do direito de votar e ser votado estão contidas na Lei 4.737, de 15/7/1965 (Código Eleitoral), e modificações posteriores. Para sua fiel execução, oTribunal Superior Eleitoral (TSE) expede Instruções a cada eleição, tendo, nas eleições municipais deste ano, disposto sobre o voto dos portadores de deficiência nos seguintes termos (Resolução TSE 21.633, de 19/2/2004):
“Art. 32. Os juízes eleitorais, sob a coordenação dos tribunais regionais eleitorais, deverão criar seções eleitorais especiais destinadas a eleitores comnecessidades especiais.
§ 1º Nos municípios em que não for possível a criação de seção unicamente para esse fim, o juiz eleitoral deverá designar uma das seções existentes para também funcionar como seção especial para eleitores com necessidades especiais.
§ 2º As seções especiais de que cuida este artigo deverão ser instaladas em local de fácil acesso, com estacionamento próximo e instalações, inclusive sanitárias, que atendam às normas da ABNT NBR 9050.
Art. 33. Os eleitores com necessidades especiais que desejarem votar nas seções especiais de que cuida o artigo anterior deverão solicitar transferência para aquelas seções até 151 dias antes da eleição. Parágrafo único. Até noventa dias antes das eleições, os eleitores com necessidades especiais que votam em seções especiais poderão comunicar ao juiz eleitoral, por escrito, suas restrições e necessidades, a fim de que a Justiça Eleitoral, se possível, providencie os meios e recursos destinados a facilitar-lhes o exercício do voto.
Art. 57. Os eleitores com necessidades especiais que votarem em seções eleitorais apropriadas poderão utilizar os meios e recursos postos à sua disposição pela Justiça Eleitoral para facilitar o exercício do voto. Parágrafo único. Os eleitores com necessidades especiais poderão contar com ajuda de pessoa de sua confiança para o exercício do voto.
Art. 58. As urnas eletrônicas, instaladas em seções especiais para eleitores com deficiência visual, conterão dispositivo que lhes permita conferir o voto assinalado, sem prejuízo do sigilo do sufrágio.
Art. 59. O eleitor cego poderá (Código Eleitoral, art. 150, I a III):
I - assinar o caderno de votação, utilizandose de letras do alfabeto comum ou dosistema braille;
II - usar qualquer instrumento mecânico que trouxer consigo, ou lhe for fornecido pela mesa, e que lhe possibilite exercer o direito de voto;
III - utilizar-se do sistema de áudio, quando disponível;
IV - utilizar-se do princípio da marca de identificação da tecla número 5;
V - assinalar as cédulas, utilizando o alfabeto comum ou o sistema braille, no caso de votação por cédulas.” A fim de que todos possam exercer comsegurança o seu direito/dever de votar, os tribunais regionais eleitorais são encarregados de fazer ampla divulgação prévia das regras e instruções que o TSEestabelece para cada eleição.
ACESSIBILIDADE
A acessibilidade, definida pela Lei 10.098, de 19/12/2000, como a “possibilidade e condição de alcance para utilização, com segurança e autonomia, dos espaços, mobiliários e equipamentos urbanos, das edificações, dos transportes e dos sistemas e meios de comunicação, por pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida” (art. 2º, I), é uma importante garantia de que os cidadãos nessa condição possam exercer o seu direito de ir e vir e viver normalmente em sociedade.
A fim de promover a acessibilidade, a Lei 10.098/00 determina a eliminação de barreiras e obstáculos que, seja nas vias e espaços públicos, seja nas edificações, seja nos meios de transporte e de comunicação, limitem o acesso, a liberdade de movimento e a circulação com segurança das pessoas (art. 1º combinado com art. 2°, II). Eis algumas das medidas que prescreve:adequação dos elementos de urbanização públicos e privados de uso comunitário – neles incluídos itinerários e passagens de pedestres, escadas, rampas, etc. – às normas de acessibilidade da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) (art. 5º);construção, ampliação e reforma dos edifícios destinados a uso coletivo segundo padrões de acessibilidade (art. 11);atendimento, pelos veículos de transporte coletivo, dos requisitos de acessibilidade estabelecidos nas normas técnicas específicas (art. 16).
Há na Lei 10.098/00 quatro artigos que dizem respeito especificamente aos portadores de deficiência sensorial/visual. Eis o que determinam:
“Art. 9º Os semáforos para pedestres instalados nas vias públicas deverão estar equipados com mecanismo que emita sinal sonoro suave, intermitente e semestridência, ou com mecanismo alternativo, que sirva de guia ou orientação para a travessia de pessoas portadoras de deficiência visual, se a intensidade do fluxo de veículos e a periculosidade da via assim determinarem.
Art. 12. Os locais de espetáculos, conferências, aulas e outros de natureza similar deverão dispor de espaços reservados para pessoas que utilizam cadeira de rodas, e de lugares específicos para pessoas com deficiência auditiva e visual, inclusive acompanhante, de acordo com a ABNT, de modo a facilitar-lhes as condições de acesso, circulação e comunicação.
Art. 17. O poder público promoverá a eliminação de barreiras na comunicação e estabelecerá mecanismos e alternativas técnicas que tornem acessíveis os sistemas de comunicação e sinalização às pessoas portadoras de deficiência sensorial e com dificuldade de comunicação, para garantirlhes o direito de acesso à informação, à comunicação, ao trabalho, à educação, ao transporte, à cultura, ao esporte e ao lazer.
Art. 18. O poder público implementará a formação de profissionais intérpretes de escrita em braille, linguagem de sinais e de guias-intérpretes, para facilitar qualquer tipo de comunicação direta à pessoa portadora de deficiência sensorial e com dificuldade de comunicação.”
Acessibilidade na administração pública e no ensino superior Onze anos antes da Lei 10.098/00, a Lei 7.853/89 já determinava a adoção, pelos órgãos e entidades governamentais, de normas e medidas promotoras da acessibilidade (art. 2º, parágrafo único, V, a). Dando conseqüência a esse comando, o Decreto 3.298/99 traz um capítulo inteiro (arts. 50 a 54) dispondo sobre a acessibilidade na administração pública federal, chegando a estipular prazo de trêsanos – portanto, já esgotado – dentro do qual esta deveria “promover as adaptações, eliminações e supressões de barreiras arquitetônicas existentes nos edifícios e espaços de uso público e naqueles que estejam sob sua administração ou uso” (art. 54).
Quanto à acessibilidade nas instituições de ensino superior, estas, segundo dispõe a Portaria 1.679, de 2/12/1999, do Ministério da Educação, deverão atender aos requisitos estabelecidos na NBR 9050, abordada a seguir.
NBR 9050
A Norma NBR 9050 – Acessibilidade de Pessoas Portadoras de Deficiências a Edificações, Espaço, Mobiliário e Equipamento Urbanos visa propiciar“condições adequadas e seguras de acessibilidade autônoma” (item 1.1). Editada em 1985 e reeditada em setembro de 1994, pela ABNT, ela preconiza, no tocante a deficiência visual, padrões como:
sinalização luminosa e sonora nos acessos de estacionamentos com cruzamento de fluxos de veículos e pedestres (item 9.1.8);
existência de dispositivo a ser acionado pelo portador de deficiência visual nas travessias de pedestres onde houver semáforo (item 9.1.9);
comunicação auditiva dentro da cabine do elevador, indicando o andar onde o elevador se encontra parado – esse padrão se aplica aos edifícios de uso público e de uso multifamiliar em que o número de paradas do elevador for superior a dois (item 10.3.3.3);
comunicação tátil nos telefones públicos onde houver possibilidade de ligações interurbanas/internacionais (item 10.4.2).
BRAILLE
O sistema braille, utilizado universalmente na leitura e na escrita por pessoas cegas, foi inventado na França em 1824 pelo pianista cego Louis Braille. O sistema não tardou a ser utilizado no Brasil, mas foi oficializado somente na década de 1960, pela Lei 4.169, de 4/12/1962, que o tornou de uso obrigatório.Em 2002, a Comissão Brasileira do Braille, vinculada ao Ministério da Educação (MEC), atualizou a grafia do braille na língua portuguesa, em trabalho desenvolvido conjuntamente com a Comissão de Braille de Portugal. A nova grafia braille foi aprovada pela Portaria MEC 2.679, de 26/9/2002, e pode ser encontrada no sítio eletrônico do Instituto Benjamin Constant (o endereço está no fim do Guia). Publicações em brailleÉ livre a reprodução de obras embraille. Segundo dispõe a Lei 9.610, de 19/12/1998 (Lei do Direito Autoral), “não constitui ofensa aos direitos autorais a reprodução de obras literárias, artísticas ou científicas, para uso exclusivo de deficientes visuais, sempre que a reprodução, sem fins comerciais, seja feita mediante o sistema braille ou outro procedimento em qualquer suporte para esses destinatários” (art. 46, I, d).
Essa disposição vem ao encontro da Lei 10.753, de 30/10/2003 (Política Nacional do Livro), que tem como uma de suas diretrizes“assegurar às pessoas com deficiência visual o acesso à leitura” (art. 1º, XII). Essa Lei incumbe o Poder Executivo de implementar programas anuais para manutenção e atualização do acervo de bibliotecas públicas, universitárias e escolares, incluídas obras em sistema braille (art. 7º, parágrafo único).
EDUCAÇÃO ESPECIAL
“Educação especial” é como a legislação define a modalidade de educação escolar voltada para pessoas portadoras de deficiência. Contudo, isso não quer dizer que os alunos “especiais” terão, necessariamente, sala e aulas exclusivamente para eles. Ao contrário, o que a Lei 9.394, de 20/12/1996 (Lei deDiretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB) determina em seu art. 58 é que a educação especial seja oferecida “dentro das classes de ensino regular”, na forma de apoio especializado; somente no caso de não ser possível a integração do aluno é que seus atendimentos educacionais se farão em classes, escolas ou serviços especializados. O mesmo encontra-se disposto no art. 54 da Lei 8.069, de 13/7/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente).Aspectos, recursos e metas da educação especial No art. 59, a LDB determina que os sistemas de ensino devem assegurar aos educandos com necessidades especiais:
“I - currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específicos para atender às suas necessidades;
II - terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir o nível exigido para a conclusão do ensino fundamental em virtude de suas deficiências [...];
III - professores com especialização adequada em nível médio ou superior, para atendimento especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns;
IV - educação especial para o trabalho [...];
V - acesso igualitário aos benefícios dos programas sociais suplementares disponíveis para o respectivo nível do ensino regular.” Enquanto a LDB se refere a recursos educativos em termos genéricos (inciso I acima), a Lei 10.172, de 9/1/2001 (Plano Nacional de Educação) é, a esse respeito, precisa.
Para citar apenas aqueles recursos que interessam de perto aos portadores de deficiência visual, o Plano prevê os seguintes objetivos e metas a serem adotados pelasunidades da Federação, com a ajuda da União (item 8.3):
tornar disponíveis no ensino fundamental, até 2006, livros didáticos falados, em braille e em caracteres ampliados;
estabelecer, em parceria com as áreas deassistência social e cultura e com organizações não-governamentais, até 2006, redes municipais ou intermunicipais para tornar disponíveis aos alunos cegos eaos de visão subnormal livros de literatura falados, em braille e em caracteres ampliados;
e estabelecer programas para equipar, até 2006, as escolas de educação básica e, até 2011, as de educação superior que atendam educandos surdos e de visão subnormal, com aparelhos de amplificação sonora e outros equipamentos que facilitem a aprendizagem.
Abrangência da educação especial e direitos dos educandos
A Lei 7.853/89, que é anterior às três leisreferidas acima e que decerto serviu de referência para elas, prescreve, em seu art. 2º, parágrafo único, I, a a f, as seguintes medidas no tocante à educação especial: a sua inclusão, no sistema educacional, como modalidade educativa abrangendo a educação precoce, a pré-escolar, as de 1º e 2º graus, a supletiva, a habilitação e reabilitação profissionais, com currículos, etapas e exigências de diplomação próprios;
inserção, no referido sistema educacional, das escolas especiais, privadas e públicas;
oferta, obrigatória e gratuita, da educação especial em estabelecimento público de ensino;
oferta obrigatória de programas deeducação especial pré-escolar e escolar em unidades hospitalares e congêneres nas quais estejam internados, por um ano ou mais, educandos portadores de deficiência;
acesso dos alunos portadores de deficiência aos benefícios conferidos aos demais educandos, inclusive material escolar, merenda escolar e bolsas de estudo;matrícula compulsória em cursos regulares de estabelecimentos públicos e particulares de pessoas portadoras de deficiência capazes de se integrarem no sistema regular de ensino.
A matrícula do educando portador de deficiência visual é, desse modo, um direito líquido e certo. Tanto é assim que a Lei 7.853/89, conforme já referido, define como crime a recusa, sem justa causa, de inscrição de aluno em estabelecimento de ensino de qualquer curso ou grau, público ou privado, por motivos derivados da deficiência que porta.
Ensino superior, educação para o trabalho e estágio De acordo com o Decreto 3.298/99, as instituições de ensino superior deverão oferecer adaptações de provas e os apoios necessários, previamente solicitados pelo aluno portador de deficiência, inclusive tempo adicional para realização das provas, conforme as características da deficiência, o mesmo valendo para o exame vestibular (art. 27, caput e § 1º).
Ao tratar da formação profissional, o Decreto, entre outras disposições, estabelece que:
“Art. 28. O aluno portador de deficiência matriculado ou egresso do ensino fundamental ou médio, de instituições públicas ou privadas, terá acesso à educaçãoprofissional, a fim de obter habilitação profissional que lhe proporcione oportunidades de acesso ao mercado de trabalho.
§ 1º A educação profissional para a pessoa portadora de deficiência será oferecida nos níveis básico, técnico e tecnológico, em escola regular, em instituições especializadas e nos ambientes de trabalho.
§ 2º As instituições públicas e privadas que ministram educação profissional deverão, obrigatoriamente, oferecer cursos profissionais de nível básico à pessoaportadora de deficiência, condicionando a matrícula à sua capacidade de aproveitamento e não a seu nível de escolaridade.”Quanto ao estágio curricular, a redação original da lei que o regula – Lei 6.494, de 7/12/1977 – admitia como estagiários apenas os alunos dos cursos superiores, profissionalizantes de segundo grau e supletivos. Desde 1994, a história passou a ser diferente.
A Lei 8.859, de 23/3/1994, alterou a Lei do Estágio, estendendo o estágio profissionalizante aos alunos do ensino especial. Portanto, as atividades de aprendizado em situações reais de vida e trabalho que caracterizam o estágio estão agora ao alcance dos portadores de deficiência visual que estudam em escolas especiais.
Disposições do MECA Portaria 1.679, de 2/12/1999, do Ministério da Educação e a Resolução 2, de 11/9/2001, da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação são normas de hierarquia inferior que também tratam da educação especial. A primeira dispõe sobre requisitos para instruir os processos de autorização e de reconhecimento de cursos e de credenciamento de instituições de ensino superior, estabelecendo em seu art. 2º, parágrafo único, que em tais processos deverá ser exigido no mínimo:compromisso formal da instituição de proporcionar, caso seja solicitada, desde o acesso até a conclusão do curso, uma sala de apoio para portadores de deficiência visual, contendo máquina de datilografia braille, impressora braille acoplada a computador com sistema de síntese de voz, gravador e fotocopiadora que amplie textos;
equipamento para ampliação de textos para atendimento a aluno com baixa visão;
planos de aquisição gradual de acervo bibliográfico em fitas de áudio e dosconteúdos básicos em braille.
Já a Resolução, que institui diretrizes nacionais para a educação especial na educação básica, estabelece em seu art. 12 que deve ser assegurada, nesse nível de ensino, a acessibilidade aos conteúdos curriculares, mediante a utilização de linguagens e códigos aplicáveis, como o sistema braille, sem prejuízo do aprendizado da língua portuguesa.
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